A violência doméstica consiste em maus tratos físicos ou psíquicos, dentro de um relacionamento de proximidade (casal, pais-filhos, etc), em que os comportamentos violentos visam o controlo do outro.
Há variados tipos de violência, enquadrados no conceito da violência doméstica.
- Violência Emocional - O agressor inflige medo ou sentimento de inutilidade na vítima através de ameaças e humilhações.
- Violência Social - A vítima é isolada, proibida de estar com familiares e amigos e tem os seus movimentos controlados. O telemóvel é, normalmente, uma das principais armas de controlo por parte do agressor.
- Violência Física - Agressão física directa e em variados níveis, ou impedimento de acesso a tratamentos e medicação.
- Violência Sexual - A vítima é forçada a praticar actos sexuais não desejados.
- Violência Financeira - O agressor controla o dinheiro, recusa o acesso da vítima ao próprio ordenado, força-a a justificar os gastos, ou ameaça retirar apoio financeiro como forma de controlo.
- Perseguição - A vítima é perseguida com o objectivo de a intimidar ou amedrontar.
Legalmente, o conceito de violência doméstica evoluiu muito e as consequências também, apesar de a lei portuguesa e as penas aplicadas ainda se encontrarem muito aquém do desejável. No entanto, não assim há tanto tempo, a violência doméstica não era sequer considerada um crime e neste momento é um crime público, não precisando ser a vítima a fazer a denúncia.
Violência Doméstica em Números
Os números de violência doméstica em Portugal são enormes e muitos são os motivos para que tal aconteça. Segundo os dados da
APAV, entre os anos de 2013 e 2018 foram instaurados 43 456 processos, nos quais, 86% das vítimas eram mulheres, 33.7% das quais casadas e em 41.2% dos casos, havia filhos a viver na mesma casa.
No entanto, estes números podem estar bem longe da realidade da violência doméstica, visto que ainda há uma significativa quantidade de vítimas que por medo ou vergonha não apresentam queixa às autoridades.
No ano passado, o crime de violência doméstica resultou em 33 óbitos, 25 mulheres, 7 homens e 1 criança.
"Em 41,2% dos casos de violência doméstica, havia crianças a residir na mesma casa."
Valores Culturais
“Entre marido e mulher, não se mete a colher.” Este é um ditado popular que ilustra bem a forma como a nossa sociedade encara o casamento e o poder que este dá a um cônjuge sobre o outro. Geralmente, ao homem sobre a mulher.
Em 2018, o Ministro da Administração Interna afirmava que o maior desafio no combate à violência doméstica é a mudança cultural. Uma mudança que tem de vir de todos nós enquanto sociedade que educa as futuras gerações, de incutir o respeito pelo outro e por si próprio.
A ideia que muitas vezes se vê na vítima, principalmente quando esta é uma mulher, de que “Eu mereci” é uma das mais difíceis de combater, porque ela encontrará muitas vozes que garantem que o erro está em si. Mereceu porque saiu, porque desobedeceu, porque não se submeteu. Ainda está muito enraizado na nossa sociedade o valor da submissão e do silêncio.
O papel do Álcool
O álcool é a droga de maior acesso em Portugal. Vista como socialmente aceite, o álcool mata centenas de pessoas todos os anos. Doenças associadas ao consumo, acidentes, actos violentos de alguém que está fora do controle. Também na violência doméstica, este parece ser um ponto fundamental.
Não são raros os relatos de agressores alcoolizados. No entanto, os vários estudos concluem que são dois factores separados, que podem coexistir, mas não estão directamente relacionados. Ainda assim, o consumo de álcool é um factor de risco, facilitador do processo, que agrava o nível de violência e o prolonga no tempo.
A vítima tende mais facilmente a perdoar um agressor alcoolizado, atribuindo a culpa pelo comportamento ao álcool em vez de ao agressor. Sem dúvida, o álcool desinibe comportamentos, mas não os justifica. Na verdade, os nossos comportamentos são regidos por uma espécie de filtro que nos indica se podemos (ou devemos) fazer aquilo que temos vontade. O álcool age “retirando” este filtro. Uma pessoa não é violenta porque está sob o efeito o álcool. A pessoa é violenta.
Outro problema associado ao consumo está na perigosidade da agressão (neste caso, física), pois o agressor sob o efeito de álcool perde mais facilmente a noção de como e onde agride, correndo a vítima maiores riscos de lesões graves e morte.
Após o efeito do álcool passar, o agressor pede desculpa e começa um período de lua de mel. Mostram-se extremamente arrependidos, mas a agressão volta sempre a acontecer.
Uma questão de Instrução?
A violência doméstica atravessa todos os sectores da nossa sociedade, independentemente da classe social ou grau de instrução, no entanto, o governo continua a apostar na educação como forma de conter o problema.
Afinal, o nível educacional é ou não relevante para a questão da violência doméstica?
Estatísticamente falando, a maioria das vítimas está, de alguma forma, dependente do agressor. Geralmente, estamos a falar de situações de trabalho precário ou inexistente, baixos salários… Uma menor escolaridade é, por norma, associada a trabalhos precários e mal pagos, mas os problemas financeiros não são o principal.
O agressor, muitas vezes, manipula a vítima a demitir-se, mesmo quando esta tem uma boa posição (às vezes, é isso mesmo que perturba o agressor, por exemplo, a vítima ganhar mais que ele) e elevada escolaridade.
Vários autores de estudos na área garantem que não podemos definir um perfil absoluto para a vítima, mas encontraram algumas caracterítiscas em comum: as vítimas são geralmente tímidas, caladas, conformadas e passivas, emocionalmente dependentes e deprimidas.
Olhando para as características acima mencionadas, parece-nos, que a principal questão é emocional. Estamos a lidar com questões do foro da auto-estima e auto-conceito e enquanto consideramos que a educação pode ter um papel positivo também a este nível, achamos que muitas mudanças teriam de ser feitas na mesma. As vítimas não precisam de factos acerca de violência doméstica, precisam de saber fazer, saber agir, ter confiança.
A Violência Doméstica é um problema de todos
A violência doméstica é, desde o ano 2000, um crime público. Isto significa que não é necessário existir uma queixa por parte da vítima e que todos os cidadãos têm como obrigação denunciar um caso do qual tomem conhecimento.
Está nas nossas mãos combater o problema da cultura do medo.
PROCURAR AJUDA
Linha Apoio À Vítima - 116006
Serviço de Informação às Vítimas de Violência Doméstica - 800 202 148 (SMS - 3060 - Quando não puder falar, escreva.)