quarta-feira, 16 de novembro de 2022

Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) - um beco sem saída?

 


A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é uma doença neurológica degenerativa e progressiva. A sua forma mais comum é a Doença do Neurónio Motor (DNM).

Doença rara, a ELA tem um impacto incomensurável na qualidade de vida do paciente.

Como tudo começa

Geralmente, as primeiras queixas prendem-se com a marcha - dificuldade em caminhar ou subir uma escada - e com os braços e mãos - dificuldade em abotoar uma camisa, por exemplo. Muitos pacientes queixam-se de estar “desajeitados”.

No entanto, as queixas podem ser amplas e difíceis de identificar rapidamente. Pode haver queixas ao nível da fala (articulação difícil das palavras), respiratórias, dificuldade em permanecer sentado sem se encostar, ou mesmo queixas generalizadas sobre todo o corpo.

Também é comum haver queixas de dormência ou cãibras nas mãos, pés, ou até mesmo, na língua.

Sintomas de ELA

Os sintomas são variados, muitas vezes parecem aleatórios, e dependem da fase da doença. Para além dos já falados na secção anterior, o paciente pode apresentar rouquidão e fala arrastada. Há dificuldade em engolir e aumento da produção salivar - há um risco elevado do paciente se engasgar com líquidos.

Verifica-se falta de força muscular, atrofia e fadiga. Numa fase mais tardia da doença, pode ocorrer alguma desinibição resultante em risos ou choro excessivo, ou inapropriado e incontrolável.

A insuficiência a nível dos músculos respiratórios é outro problema sério destes pacientes, muitas vezes, sendo esta a responsável pela sua morte.

Causas para o Desenvolvimento da Doença

As causas da doença são, até à data, desconhecidas, no entanto, estudos encontraram algumas correlações a ter em conta. Para além dos fatores hereditários, há estudos que indicam que uma acumulação de proteínas tóxicas nos neurónios que controlam os músculos pode ser a explicação para certos casos. 

Apesar de não haver conclusões consistentes, a exposição a produtos químicos, como o chumbo, parece estar relacionada com o surgimento de ELA. O tabagismo, especialmente no caso das mulheres em fase de menopausa, aparece na maioria dos estudos como um fator de risco.

Diagnóstico

O diagnóstico é muitas vezes feito por exclusão, especialmente no início da doença. É sugerido pela fraqueza motora progressiva, generalizada e sem anomalias relevantes.

Desta forma, para o diagnóstico de ELA, o paciente deverá fazer uma RM ao cérebro e à coluna, bem como exames laboratoriais para avaliar outras possíveis causas para os sintomas descritos.

Tratamento e Prognóstico

Não existe, atualmente, tratamento para ELA, pelo que o mesmo é sintomático e de apoio às necessidades pessoais de cada paciente.

É uma doença degenerativa e progressiva, que não vê remissões. A esperança média de vida do paciente vai depender do tipo de sintoma e pode ser tão variada como 2 ou 15 anos. Na verdade, a evolução de cada caso é única e imprevisível. 

ELA em números

Apesar de a doença poder surgir em qualquer idade, a idade média para o aparecimento dos primeiros sintomas é 60 anos, atingindo igualmente homens e mulheres. Algumas estatísticas revelam uma frequência ligeiramente superior no sexo masculino.

Em apenas 10% dos casos, podemos afirmar que a doença tem origem genética e hereditária, sendo que os restantes 90% de casos têm origem desconhecida e é mais frequente em indivíduos caucasianos.

Estima-se que existam entre 3 e 5 casos de ELA por cada 100 mil pessoas.

Há esperança

O diagnóstico de ELA é absolutamente devastador para o paciente e família. A impossibilidade de uma cura levanta questões do foro psicológico e emocional e até mesmo social difíceis de lidar. No entanto, ainda há esperança.

Enquanto cientistas e laboratórios trabalham no sentido de uma potencial cura, já existem disponíveis medicamentos que ajudam a diminuir a velocidade de progressão da doença, prolongando a vida do paciente. Essas drogas, em conjunto com outras medidas de reabilitação e apoio, proporcionam, hoje em dia, ao paciente com ELA uma maior qualidade de vida.


segunda-feira, 12 de setembro de 2022

O impacto da Religião na Saúde Mental

 


A religião já provocou guerras, mortes, preconceitos e todo o tipo de efeitos nocivos na sociedade. Há quem cometa as maiores atrocidades em nome desta ideia de espiritualidade e missão superior. Mas já alguma vez se questionou qual o impacto da religiosidade na saúde mental?

Para a psiquiatria, a religião tem má reputação. Historicamente, é associada a rituais e atitudes que prejudicam a evolução e tratamento do quadro clínico. Freud considerava-a uma neurose obsessiva e, muitos psiquiatras ao longo do tempo, afirmaram que era uma fonte de sofrimento psicológico. Mas será mesmo assim?

Religião como farol orientador

A religião é muito importante para dar um significado e uma orientação (valores) à nossa vida. Ela é fundamental em momentos de grande impacto na vida de um pessoa e a Associação Mundial de Psiquiatria reconhece a relevância da espiritualidade e da religião nas questões de saúde mental.

A espiritualidade e religião dá um sentido a momentos difíceis como perda e luto, dando um significado que facilita a aceitação. Dá-nos ainda um sentido de pertença a um grupo (os que partiham das mesmas crenças que nós), fundamental para sentirmos que temos o nosso lugar no mundo.

O papel da espiritualidade no tratamento

Especialistas em saúde mental de todo o mundo concordam que a fé e o apoio oferecido pela religião ou espiritualidade institucionalizada dão uma ajuda fundamental no processo de cura. Depressão, ansiedade, vício são algumas das perturbações mais comuns e que mais beneficiam desta ligação espiritual e de pertença a um grupo. 

A vivência da religiosidade e espiritualidade é uma ferramenta útil para enfrentar as dificuldades do dia a dia e permanecer fiel ao tratamento.

Oração como Meditação


Atualmente, é do conhecimento geral os efeitos benéficos da meditação. É inegável como esta pode ajudar a lidar com o stress e ansiedade do dia a dia. 

Muitas pessoas usam-na para tomar grandes decisões de vida, ou simplesmente para se acalmar. Bom, a oração, presente na maioria das religiões, é uma forma de meditação.

É um momento solitário da pessoa em que ela fala com um ser superior, ou simplesmente consigo mesma. É um momento em que nos alheamos do que se passa à nossa volta e nos voltamos para dentro. Tem um efeito calmante e terapêutico considerável. 

Combate o Desespero

Quando acreditamos em algo maior e mais poderoso que nós, que está lá para nos ajudar, é mais fácil combater o desespero. Quando para os outros parece uma tragédia inevitável, para as pessoas religiosas ainda há um último recurso.

Há algo ali, um ser ou entidade que pode tudo. Há que ter fé e pedir. Esta crença fornece uma força extra para enfrentar as adversidades, porque aconteça o que acontecer, estas pessoas sentem que não estão sozinhas. 

Dá sentido às adversidades

Ter uma religião, ou uma crença espiritual tem um peso importante na forma como enfrentamos as adversidades. A religião atribui um sentido ao sofrimento, não é aleatório.

Nem sempre este sentido é o mais desejável, mas retira muito do sentimento de aleatoriedade, injustiça e descontrolo que nos assola nos maus momentos. Um bom exemplo disto é o processo de luto. A ideia de que a pessoa falecida continua a viver noutro lugar, um lugar melhor, no qual um dia voltarão a encontrá-la tem um efeito tranquilizante na família e amigos enlutados.

 

Sentimento de pertença

Sentir que não estamos sozinhos é muito mais do que ter companhia. É sentir que pertencemos, que há alguém que, aconteça o que acontecer, estará lá por nós. Para algumas pessoas, a espiritualiade por si só e a crença em Deus ou noutro Ser Superior é o suficiente para este sentimento. No entanto, ser religioso dá-lhes mais do que isso.

O sentimento de pertença é enorme, quando há um grupo de pessoas que pensam e sentem como nós. A religião fornece-nos isso. Faz com que os crentes se sintam mais acompanhados e oferece uma rede de apoio social. 

A vivência da religião importa

Vários estudos têm demonstrado o impacto positivo que a religião tem na saúde física e mental do indivíduo a vários níveis. Indiscutivelmente, a pessoa que vive a sua espiritualidade de forma positiva tem uma menor susceptibilidade a perturbações do foro psicológico.

No entanto, o impacto negativo de certas práticas, do fanatismo e da negação da ciência nalgumas comunidades religiosas não pode ser ignorado, representando um factor de risco vital na procura por tratamento adequado, por exemplo, na esquizofrenia. 

Espiritualidade Negativa

A espiritualidade e religião surge nas mais variadas formas e, enquanto no geral, é benéfica, também pode ter um efeito negativo em situações muito específicas.

Durante a Idade Média, por exemplo, a religião era usada de forma castradora. Deus, ou o Ser Superior em que acreditavam, era usado de forma quase chantagista, para controlar as massas e obrigar as pessoas a comportar-se “adequadamente”.

Esta mentalidade, actualmente ultrapassada, continua no entanto em vigor em certas comunidades e tem um impacto tremendo na saúde mental e, até mesmo, física. Quando se encara a religião de forma punitiva, os níveis de ansiedade e depressão elevam-se, podendo mesmo conduzir, nos casos mais extremos, à morte.

O fanatismo religioso e a crença cega nas capacidades do divino também poderão levar os doentes a não procurar ajuda ou abandonar tratamentos indispensáveis à sua vida.

Religião e Saúde Mental

A ligação entre a religião e saúde mental tem sido abordada de diferentes formas e os estudos podem ser controversos, de acordo com a amostra escolhida.

O fanatismo e obcessão poderão dificultar o tratamento das doenças mentais, no entanto, a vivência saudável da religião tem um impacto positivo na saúde mental geral do indivíduo.

A religião vivida de forma positiva e descontraída contribui para uma melhor qualidade de vida. 

terça-feira, 17 de maio de 2022

O que a sensação de perigo eminente faz ao cérebro de uma criança


 


O que sente quando a sua segurança está a ser ameaçada? E se fosse assim todos os dias?

Com a guerra na Ucrânia no top dos assuntos da actualidade, devemos todos parar para pensar nisto. No nosso dia a dia, sentimo-nos seguros. Podemos passar segurança aos nossos filhos, podemos dizer-lhes que vai ficar tudo bem. E se não pudessemos? 

Mudança drástica de vida

A sensação de se estar em constante perigo é desgastante e destrói-nos lentamente. No caso das crianças pode provocar enormes retrocessos no seu desenvolvimento, que poderão nunca ser recuperados. É claro que não é só as crianças de países em guerra que podem sentir-se constantemente em perigo. Também ocorre em situações de violência doméstica, por exemplo, e com resultados muito semelhantes. Mas, por agora, foquemo-nos nas situações de conflito armado. 

As sirenes tocam toda a noite, a qualquer momento, impedindo um sono tranquilo. Mesmo os bebés que não compreendem o que se passa, não conseguem dormir com o barulho e agitação. 

Têm de fugir de suas casas. O seu porto seguro, o lugar onde deveriam sentir-se em paz, já não é seguro de todo. Para além da insegurança, todas as crianças precisam de manter a noção de pertença, a um grupo, a um espaço… com o potencial desaparecimento da sua casa, essa sensação de pertença desaparece. A vida pode nunca mais voltar ao que elas entendem como normal. Tudo o que eles conhecem agora é o medo, a fome, a sede, a solidão e a incerteza.

Onde está o pai?

Uma das mudanças mais drásticas e desastrosas que a guerra traz é a morte de pessoas próximas, pessoas que as crianças conhecem, amam, pessoas que são uma referência. Mas a morte não é a única que arranca estas pessoas às crianças.

Há muitas circunstâncias que podem provocar um afastamento da criança da família. A mais comum é o facto de terem de fugir com as mães e os pais terem de ficar para trás. Porque o pai fica naquele sítio perigoso? 

O desaparecimento, mesmo que momentâneo de um dos progenitores é um dos eventos mais traumáticos da vida de uma criança. E eles sabem que essa pessoa está em perigo. 

Stress permanente

O stress é uma condição em que o indivíduo vivencia um desafio que está além das suas capacidades de enfrentamento. Esta poderia ser também uma das descrições da guerra.

O stress é especialmente prejudicial nos primeiros anos de vida. A maleabilidade do cérebro nesta fase da vida torna-o particularmente sensível às influências ambientais, provocando uma alteração significativa da organização cerebral da criança.

O stress permanente provoca alterações físicas no cérebro da criança - pode levar a uma redução do volume cerebral. Provoca uma desregulação do sistema neuroendócrino e disfunção límbica, que se pode traduzir por depressão, ansiedade, e problemas de memória (quando afecta o hipocampo). Pode afectar ainda o comportamento e capacidade de tomada de decisão, bem como dificuldade em controlar os impulsos.

As relações

O ser humano é um ser social e precisa relacionar-se com os outros, certo? Sim, mas para se tornar esse ser sociável e especial, a criança precisa de ter relacionamentos saudáveis desde tenra idade. Caso contrário, terá sérias dificuldades em relacionar-se com os demais.

Se a criança se sente em perigo constante, se não sabe de onde esse perigo pode vir, vai ter muito mais dificuldade em confiar e relacionar-se com os outros. Esta sensação de desconfiança vai manter-se ao longo da vida, criando um adulto que tem dificuldade em confiar nos outros, em relacionar-se e opta por uma atitude muito defensiva em relação a todas as pessoas e situações.

Muitas vezes esperamos ver as crianças com reações semelhantes às do adulto com distúrbio de pós-stress traumático, no entanto, os nossos pequenos funcionam de forma bem diferente de nós. A ideia de que as crianças são muito mais resilientes do que os adultos tem algum fundo de verdade, mas também vem do facto das suas reações serem diferentes das nossas.

Muitas vezes, a criança parece que ultrapassou toda a situação, que não se apercebe de nada, ou que não entende. Assim que é colocada num ambiente seguro, segue a sua vida com normalidade. Ultrapassou. O problema é que as lembranças ficam lá, a sensação de medo e de susceptibilidade fica lá, ainda que não saibam verbalizá-las. Os danos já estão feitos e podem emergir em qualquer altura, às vezes, dezenas de anos mais tarde.

Que adultos serão estes?

Está mais do que comprovado que a exposição a violência constante, em todas as suas formas (mesmo violência verbal) provoca alterações cerebrais aos nível da amígdala, principal responsável pela regulação das nossas emoções.

Algo que tentamos (ou devíamos tentar) ensinar aos nossos filhos desde cedo é a tentar regular as suas emoções - note-se que regular é muito diferente de evitar ou constranger. É um dos sinais de maturidade mais óbvio. Então que adultos serão estes? Conseguirão dar a volta à situação um dia?

A resposta é incerta, mas é imporvável. As marcas ficam para sempre. As crianças, ao contrário da crença popular, não esquecem nunca. Mesmo para as mais pequenas, fica algo, lá no fundo da sua mente, que mesmo não conseguindo expressá-lo as torna ansiosas, medrosas. Serão provavelmente adultos que nunca se sentirão totalmente em paz e nem saberão porquê.

A sensação de perigo está sempre ao virar da esquina

Todos nós já passamos por situações em que nos sentimos em perigo, mas felizmente, poucos sabemos o que é ter essa sensação constantemente. Quando somos crianças somos muito mais sensíveis aos acontecimentos e as marcas mais difíceis de apagar.

No entanto, uma experiência traumática não tem de ser o fim. A presença de cuidadores sensíveis, que correspondam às necessidades de afecto e compreensão da criança são fundamentais para a ajudar a lidar com o stress e evitar danos irreversíveis no seu desenvolvimento. 

quarta-feira, 11 de maio de 2022

Cuidar do idoso, o derradeiro desafio

 



Numa população cada vez mais envelhecida, faz cada vez mais sentido falar sobre isto - cuidar do idoso. Este cuidado não é simplesmente dar-lhe comer, ou ajudá-lo a vestir. Vai muito para além disso. 

Em Portugal, a maioria dos cuidadores são eles próprios idosos, com todos os problemas que isso acarreta. Em pouco tempo, o cuidador precisará ele próprio de cuidados  e a sociedade não esta disponível para os dar. As instituições não chegam para todos os pedidos.

O que é cuidar?

Os cuidados com o idoso vão muito além de dar a medicação na hora certa, ou fazer a higiene. Ser cuidador exige empatia, diálogo e amor. A pessoa que precisa de cuidados precisa de muito mais do que o cuidado físico básico.

É muito frequente ver os cuidadores a tratarem o idoso de forma infantilizada. Não há nada mais degradante do que isso. Não é uma criança, é um adulto a precisar de ajuda. Infantilizar um idoso vai destruir a sua auto-estima e contribuir para problemas do foro emocional, nomeadamente, depressão. O seu familiar idoso tem opiniões, ideias e vontades. 

Se a pessoa estiver lúcida, não há razão para não a deixar tomar as suas próprias decisões. Se a lucidez já começa a faltar, ou percebemos que é uma decisão que coloca a pessoa em risco, então devemos conversar, argumentar e dialogar. Evite dizer “é assim porque eu quero” ou “sou eu que mando”. Na dúvida, coloque-se no lugar da pessoa - o que gostaria que lhe dissessem ou fizessem naquela situação?

Saúde mental - de ambos

Não raras vezes, estamos tão preocupados com a saúde física, que nos esquecemos da saúde mental - vital para o nosso bem-estar e bom funcionamento diário.

No caso do cuidador, tem um trabalho duplo a nível de saúde mental, pois tem de se preocupar com a saúde mental do idoso e a sua própria. 

Não é fácil encontrar este tipo de equilíbrio, até mesmo pelo facto de termos pouco tempo e estarmos constantemente ocupados com a pessoa a cuidar. No entanto, sentirmo-nos bem psicologicamente é fundamental para uma boa convivência numa etapa de vida tão difícil, quer para o cuidador, quer para o cuidado.

O Sono

O sono no idoso é um assunto delicado, pois pode oscilar entre uma permanente sonolência, ou uma total falta dele. Isto pode ser um problema para o cuidador, pois, se por um lado o excesso de sono pode levantar preocupações, a completa ausência dele pode ser extenuante, caso a pessoa queria circular pela casa ou chame constantemente, por exemplo.

Mesmo quando dormimos a noite inteira, pode haver situações em que o sono não é raparador e isso afecta o nosso dia. Esta situação é mais frequente à medida que a idade avança e pode deixar o idoso menos disposto, mais cansado ou até mesmo irritável. Por esse motivo, é importante promover momentos relaxantes e de pausa, especialmente quando se aproxima a hora de deitar. Estes podem ser determinantes para o descanso de ambos. 

A higiene

A hora da higiene suscita sempre muitas dúvidas e receios. Maioria das vezes, não tem a ver com o acto em si, mas com algums constrangimentos de parte a parte. De facto, se a pessoa está lúcida pode até sentir-se humilhada por necessitar que outra pessoa lhe dê banho ou troque uma fralda.

A melhor forma de lidar com isto é agir com naturalidade e tentar que a pessoa usufrua do maior conforto possível. Em momento algum, o idoso deve ser chamado à atenção por ter urinado na cama, ou por precisar de fraldas. Mais uma vez, é um exercício de empatia: como se sentiria se fosse consigo?

É importante também lembrar, especialmente para as pessoas cuja profissão é cuidar de idosos, que um idoso não são todos os idosos. Cada pessoa tem a sua personalidade e direito à sua individualização. Pessoas diferentes têm necessidades diferentes e é uma obrigação do cuidador tentar detectá-las.

O Banho

O banho é um momento delicado que enche o idoso de constrangimentos. O ideal é o mesmo ser dado num local calmo (onde o idoso não se sinta exposto), deve ser rápido (tanto quanto possível) e deve ser proporcionado ao idoso alguma sensação de autonomia, por exemplo, dar-lhe a esponja para se ensaboar se tiver condições para tal.

Outra coisa a ter em conta é que muitos idosos sentem desconforto e mesmo dor ao toque. Seja delicado e tenha paciência. 

Cuidados de pele

A pele dos idosos tende a tornar-se mais seca e por isso, fere com maior facilidade. Uma boa hidratação é fundamental para evitar feridas, especialmente em pessoas acamadas - as famosas escaras, dolorosas e difíceis de curar.

Além do cuidado directo com a pele - mantê-la limpa e hidratada - deve haver especial cuidado com a roupa de cama e de vestir. Escolha peças confortáveis, de tecidos naturais que não causem fricção no contacto com a pele.

Alimentação

Tal como a higiene, a alimentação é um tema fundamental e exige certos cuidados.

A maioria das pessoas mais velhas precisa de uma dieta especifíca ou pelo menos certos cuidados na alimentação. Doenças como a diabetes, colesterol ou hipertensão precisam da ajuda da alimentação para serem controladas. Para além disso, com o passar do tempo podem surgir alterações do palato e intolerâncias alimentares, que nem sempre são óbvias e às quais devemos estar atentos.  

É ainda preciso um extremo cuidado no próprio momento de alimentar. Oferecer porções pequenas, mais facilmente digeríveis e mais vezes ao dia, bem como garantir que a pessoa não se engasga, especialmente se tiver se ser alimentada deitada ou quase. Para os idosos acamados é ainda importante oferecer aliemntos ricos em fibra. A falta de movimento pode provocar obstipação e a fibra ajuda a evitá-la, dando mais conforto à pessoa.

Conforto e Vida Social

Ter conforto e bem-estar vai muito mais além das necessidades básicas. Entretenimento e possibilidades de convívio e contacto social são também muito importantes. Procure proporcionar actividades, dentro do gosto pessoal da pessoa que não só estimulem o cérebro (e se possível o físico), como também a deixem entretida e de bom humor. 

Todas as actividades que estimulem a socialização e o contacto humano são bem-vindas.

Não somos sempre fofinhos

A imagem do idoso como o avôzinho ou avózinha queridos e fofos que nos enchem de amor e carinho nem sempre é a realidade do cuidador.

Há muitos motivos para tal acontecer e alguns estão directamente relacionados com a personalidade da pessoa. Os idosos são muitas vezes desprovidos de vontades, personalidade, ou maneira de ser pelas pessoas à sua volta. Mas isto não faz sentido. Cada um continua a ter a sua própria maneira de ser e forma de estar, com tudo o que isso implica.

Outro momento que muitos não esperam é quando em caso de demência ou patologia do foro mental, o idoso se torna agressivo e antipático, muitas vezes recusando cuidados. A revolta pela situação em que se encontram também é frequente.

Em qualquer dos casos, o cuidador não precisa de julgamentos, precisa de ajuda. Lembre-se também que não tem de fazer tudo sozinho e pode recorrer a ajuda de profissionais, sempre que sentir essa necessidade.

Diante de reações desagradáveis, o ideal é sempre manter a calma e tomar uma atitude conciliatória em vez de confrontatória. Tente negociar com a pessoa e terá a vida de ambos mais facilitada.

O desgaste do cuidador

O cuidador do idoso nem sempre é valorizado como devia, seja pelo governo e pela sociedade, seja pelos mais próximos. Muita gente, ainda encara o cuidar de pessoa idosa como dar comer ou ajudar no banho e esquecem todo um lado emocional e de esforço físico envolvido. 

Apesar das dificuldades do ponto de vista físico, como a força necessária para levantar a pessoa ou as poucas horas de sono, foquemo-nos no lado emocional.

O cuidador está sob um stress muito grande e considerável exaustão. Isto leva muitas vezes a um processo de isolamento social do qual resulta mais cansaço e frustração - muitas vezes, a única pessoa com quem tem interacções significativas é o idoso. 

É preciso proporcionar ao cuidador momentos de descanso e lazer, para que o desgaste emocional não se torne insuportável. 

O derradeiro desafio

À medida que a idade avança várias condições afectam as nossas capacidades físicas e psíquicas. As mesmas tornam a pessoa idosa mais susceptível a acidentes, quedas e outras situações de risco. 

A figura do cuidador é vital. No entanto, pode ser extremamente difícil e desgastante para ambos. Para uma eficaz relação entre cuidador e cuidado é preciso haver respeito mútuo. O idoso é uma pessoa com vontade própria e deve ser respeitada como tal. Há que respeitar e honrar as suas escolhas sempre que possível - sempre que não coloquem o próprio, ou terceiros, em risco. 

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

Porque é que tudo me irrita?



Todos nós já tivemos aqueles dias em que até o respirar das outras pessoas nos parece irritante. Muitas vezes, sem explicação, sentimos uma raiva imensa, que geralmente desaparece também sem explicação.

A irritabilidade é um estado emocional ou reação desencadeada por estímulos que nos fazem sentir raiva ou frustração. É natural e ocorre a todos nós. No entanto, se para algumas pessoas ela é circunstancial e autolimitada, também as há que parecem estar permanentemente irritadas. Até que ponto, pode a irritabilidade ser considerada uma simples e normal resposta a um estímulo e não uma patologia?

O que é que estou a sentir?

A sensação de irritabilidade é acompanhada por vários sintomas tanto físicos como psicológicos. O cançaso, aumento da tensão arterial e da temperatura corporal, suores, taquicardia, vertigens e tremores e até dores de cabeça são sintomas frequentes quando estamos irritados.

Do ponto de vista psicológico, os sintomas podem ser tão ou mais graves do que os descritos anteriormente. A pessoa sente uma grande impaciência e intolerância em relação ao que está à sua volta. Qualquer coisa, às vezes mínima, a pode tirar do sério.

Emocionalmente, a sensação de raiva pode ser avassaladora e a pessoa irritada sente um descontrolo tal, que pode passar dos limites do razoável. A agressividade tanto física como psicológica é um dos sintomas mais comuns.

Os pensamentos negativos são outro problema. A pessoa está irritada e é inundada por pensamentos negativos. Estes provocam uma maior irritação. Gera-se assim um ciclo vicioso do qual é difícil sair. 

Porque é que me sinto assim?

São muitas as circunstâncias que nos levam a ficar irritados momentaneamente, mas a irritabilidade geral, vista muitas vezes como traço de personalidade, é algo um pouco diferente.

Factores como as experiências pessoais, personalidade e maturidade podem influenciar esta resposta do organismo. No entanto, ela pode também ser um sinal do nosso corpo a dizer-nos que algo está mal. Situações como o cansaço excessivo, prisão de ventre ou dores, principalmente de cabeça, levam a falta de paciência e consequentemente, irritabilidade. Alguns medicamentos podem também exacerbar a sua falta de tolerância a determinados estímulos.

Da mesma forma há uma série de transtornos psicológicos que também podem ser responsáveis pela irritabilidade.

Como posso sentir-me melhor?

Em muitas situações, a irritabilidade e mau humor deve-se a uma doença específica. A mesma tem de ser encarada com seriedade e tratada, ou controlada no caso de doenças crónicas.

Outras vezes, o constante mau humor pode melhorar significativamente com uma alteração de rotina, realização de exercício físico, ou descoberta de um novo hobbie. Em todos os casos, a psicoterapia é recomendável. Ela vai ajudá-lo a reconhecer e identificar os seus sentimentos, o que os despoleta e o momento em que está prestes a sentir um fluxo de irritabilidade.

A irritação contagia

O estado de irritabilidade é desgastante tanto física como emocionalmente. No entanto, não é só a pessoa que o sente que se desgasta e sofre. Todos à sua volta sofrem o impacto deste problema. A pessoa é percebida como pouco tolerante, insuportável e fora do controlo, deteriorando as suas relações, o que a faz sentir-se ainda pior. 

Ser facilmente irritável não é um tipo de personalidade, não é sinceridade, nem é ser “difícil mas boa pessoa”. A irritabilidade excessiva torna-nos pessoas sós e difíceis de lidar e pode ser sinal de uma doença mais ou menos grave. 

É importante investigar o problema e tomar as acções necessárias para que se sinta melhor consigo e com os outros.